sábado, 4 de janeiro de 2014

Um conto_


Andar de bicicleta
TadeuCosta


Segunda, 8 da manhã, estou a caminho do trabalho com a minha bicicleta, e me aproximo de um sinal de trânsito, que acaba de fechar. Paro a bicicleta apoiando o pé direito na guia, e alguns centímetros na faixa de pedestres. Aproxima-se lentamente um Meriva. A motorista, uma senhora de aproximadamente 70 anos, me pergunta: “Como você aprendeu a andar de bicicleta?”. Olhei o sinal. Atento ao trânsito, respondo com poucas palavras: “Fixe o seu olhar em uma linha imaginária e pedale”. Ela me olhou incrédula pela resposta sucinta, e acrescentou: “Vou continuar dirigindo o meu carro, é mais seguro”.

Pensei comigo: que engraçado, a insegurança deixa de existir a partir do momento que começo a obstinadamente me proteger. Olhei para frente, olhei para a senhora, nos falamos “bom dia!”. O sinal abriu. Carros, motos, bicicletas e pedestres seguiram sua direção.
Todas as terças, quartas e quintas faço esse percurso pela avenida Água Espraiada, e sempre encontro no mesmo local alguém com uma pergunta inusitada. Da próxima não olharei para saber quem está ao volante.

Continuo meu trajeto, refletindo sobre os benefícios que a bicicleta proporciona: andar e se exercitar sem fadiga de tendões e músculos, e se locomover a uma velocidade razoável, sem interferências. Os demais veículos não proporcionam isso.
Fico feliz com minhas certezas.

Carros, ônibus, caminhões, todos se acumulam no sinal fechado seguinte. Olhei para a direita e esquerda, a fim de verificar se havia pedestres entre os carros. Parei à espera do sinal verde.
Enquanto isso, vieram cenas nítidas dos primeiros dias em que peguei a bicicleta do meu pai para andar. Era uma tarde muito quente de janeiro, férias do Guido Marlière. O que mais queria era mostrar a minha habilidade e o equilíbrio para minhas irmãs, irmãos e amigos. O mundo para mim se chamava Beco do Pires.

É inevitável pensar na infância sem soar meio bobo, saudoso e melancólico.

O sinal abriu.

Minha idade mudou e com um vigor que desconhecia.

Toda a tensão em torno do impulso para a primeira pedalada. Mostrar força e confiança como se tivesse acabado de aprender a andar...

Ouço buzina forte (várias vezes).

Um BMW X6 sente-se ameaçado por um carro mortal Siena. O motorista quer mudar de pista somente porque deu a seta. Que absurdo... O Siena quase bate no Mercedes. O motorista não tem noção do volume de tecnologia empregado em X6. Realmente não tem.

Continuo a minha viagem pelo trânsito e seus motoristas, donos de um objeto móvel, que tem custo superior a todas as coisas possíveis. Caminhamos para o sinal seguinte, e assim até o ponto final: trabalho, escola, casa...

O sinal acabou de fechar.

Não sei se meu pai enfrentava o volume de carros, em proporção, na época em que andava com a sua bicicleta por Cataguases. Mas o trânsito da cidade vivia e vive em função da passagem do trem de minério, que interrompe os carros duas vezes ao dia. Esperar o trem passar, na época, criava um grande congestionamento: dez carros, três carroças (sendo duas de burro e uma de cavalo), 40 pedestres, 30 bicicletas.

Cheguei ao meu trabalho.

Bom dia, Reinaldo. Como vai, tudo bem?

Tudo bem, respondeu. Em seguida, disparou a cobrança de mais de cinco anos:

Ainda não comprou um capacete para andar de bicicleta?!
Putz! Que saco, toda vez esse cara me cobra isso.
Respondi rapidamente: Ando com muita atenção.
Mas você tem que entender que esse trânsito de São Paulo é muito agressivo.
Não vale a pena arriscar.

Boa tarde, sr. José. Quanto custa este capacete? E este?
E aquele?...
O sr. aceita cartão de crédito?

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